Droga ineficaz leva à condenação do laboratório Eli Lilly

Nove famílias que ingressram com ação contra o laboratório farmacêutico Eli Lilly do Brasil conseguiram mais uma vitória na Justiça. O TRF da 3.ª Região negou provimento a recurso apresentado pela empresa e manteve a sentença que obriga o laboratório a ressarcir os pais cujos filhos morreram durante tratamento de câncer.

Eles foram tratados com lotes ineficazes do medicamento Oncovin.

"Eu, como juiz, me impressiono, e muito, com a morte dessas crianças. Tenho convicção da responsabilidade do laboratório nesses óbitos", afirmou o juiz federal Leonel Ferreira no julgado.

Os valores da indenização não foram definidos, pois a sentença prevê que as pessoas que se sentiram lesadas devem entrar com processos individuais para que as liquidações indenizatórias sejam individuais.

A ação foi movida pelo Ministério Público Federal, depois que a oncologista Sílvia Brandalise - que era chefe do Serviço de Hematologia e Oncologia do Departamento de Pediatria da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) - denunciou à Associação Paulista de Medicina "reduções substanciais do princípio ativo vincristina na composição de dois lotes do Oncovin".

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo, em matéria assinada pela jornalista
Tatiana Fávaro.

O medicamento, comprado pela extinta Central de Medicamentos (Ceme) para o SUS, foi usado entre setembro e dezembro de 1983 - época em que os pacientes tinham entre 3 e 5 anos.

A oncologista Sílvia ainda chefia o serviço da Unicamp e também preside o Centro Infantil Boldrini, em Campinas (SP), que é referência no tratamento de câncer infantil. Segundo ela, o medicamento, usado nas quatro primeiras semanas do tratamento da leucemia linfoide aguda, promove um índice de remissão de 96%. "Mas nessas crianças, a taxa variou de 20% a zero", afirmou.

Quando identificou os resultados dos tratamentos, Sílvia pediu a interdição do uso das três medicações utilizadas (Corticoide, Daunoblastina e Oncovin) e levou amostras para testes em institutos no Brasil e no exterior: "Compramos as medicações do mercado, de outros lotes, para continuar o tratamento, mas fui investigar o que tinha ocorrido".

Um laudo do St. Jude Childrens Research Hospital, reconhecido pelo tratamento de câncer infantil nos EUA, apontou menos de 1% do princípio ativo nas amostras de Oncovin.

Outro laudo, do Instituto Nacional de Saúde dos EUA, também mostrou redução substancial do princípio ativo.

Ação demorada

A oncologista levou os documentos às Associações Brasileira e Paulista de Medicina, ao Ministério Público Federal, ao Ministério da Saúde e à reitoria da Unicamp.

Além dos resultados internacionais, foram elaborados laudo e contraprovas pelo Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde, da Fundação Oswaldo Cruz. Foi constada a ineficácia dos lotes do medicamento vendidos à Ceme. O Ministério da Saúde suspendeu sua comercialização em 1984.

A ação contra o laboratório foi movida em 1986 e em março de 2000 a Justiça Federal julgou o caso em primeira instância, condenando a empresa às indenizações. Em 2001, o laboratório recorreu.

Os autos só chegaram à Procuradoria Regional da República em 2011. Em agosto, o procurador Walter Claudius Rothengurg emitiu seu parecer, contra a Lilly - que sustentava não ter ocorrido alteração na composição do medicamento.

O procurador escreveu em seu parecer que "o laudo do Instituto Adolfo Lutz - de que o réu tenta se valer para isentar-se de responsabilidade - revela-se inconclusivo". A análise constatou "a presença da vincristina sem, contudo, pronunciar-se sobre sua potencialidade".

Em novembro, o TRF-3 acompanhou o parecer do procurador e negou recurso à empresa. Sílvia lamentou o fato de as vítimas terem de buscar seus direitos individualmente, quando o processo acabar. "O cidadão comum fica sem suporte, sem ter a defesa que a Constituição nos garante."

O laboratório ainda pode recorrer ao STJ e ao STF.

Fonte: Tribunal Regional Federal da 3ª Região

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